Postagem do Facebook em 08/08/2019


EU FUI DEMITIDO

Depois de 15 anos me dedicando por uma empresa, me vi descartado pela crise.
Não era uma boa hora. Eu tinha carnes a pagar e ainda escola de dois filhos. Eu estava perdido, sem rumo. Minha esposa não transparecia, mas também estava. Ela fala com otimismo, diz que foi melhor assim. Mas quem vive na pele essa situação sabe o quanto é humilhante ser demitido de um trabalhão ao qual você se dedicou quase que uma vida. A sensação de impotência, de rejeição é horrível e te faz sentir vergonha de ser você, vergonha dos seus colegas. Até vergonha da minha família.
Minha esposa é uma super parceira, ela sempre me ajudou muito. Mas sei que ela ficou também apavorada. Até que um dia chegou em casa com um número de telefone para que eu agendasse uma consulta com uma tal de “Coaching”. Disse que tinha excelentes recomendações, e que através dessa pessoa eu arrumaria melhor um trabalho. Era como se fosse uma “terapia profissional”.
Óbvio, não aceitei. Eu não gastaria dinheiro nesse momento desnecessariamente. E contar minha vida para alguém é bem desnecessário. Além do mais, pagar para alguém me ouvir? Tenha santa paciência !
O fato é que de tanto ela falar, e falar (porque a Solange é assim, enquanto ela não consegue ela não desiste e continua falando na minha cabeça) ela me convenceu a marcar uma consulta.

Cheguei ao consultório extremamente constrangido. Eu que sempre fui dono de mim, sempre decidido e seguro de si, agora estou ferrado e tendo que procurar terapia. É mesmo meu fim.

- Bom dia! Você deve ser o Alex… Muito prazer!
- Bem, não digo o mesmo. Nunca pensei que um dia eu precisaria de um serviço como o seu. Não me leve a mal, mas eu realmente estou bem desconfortável.
- Acho isso bem normal Alex. Fique tranquilo. Você pode me contar um pouco de você?
- Bem doutora, eu não tenho muito o que dizer. O que você quer realmente saber?
- Gostaria que me dissesse quem é o Alex.

Puta merda. Quem é a bosta do Alex. Só isso que veio para mim na hora. Essa é o tipo de pergunta que ninguém faz, quem dirá quando você está num momento ruim da vida. O que veio pra mim foi “Alex é um bosta que trabalhou duro durante 15 anos para uma empresa que não pensou em nenhum sacrifico que ele fez quando meteu o pé nele. Um idiota que não estudou tanto quanto deveria, não fez uma boa poupança e também nunca foi feliz com esse trabalho. Acordava às 6 da manhã todo dia para ir para a fábrica e saia as 17:15 da tarde, já podre de tanto ouvir a radio peão e além de tudo, fazendo sempre cara de bom humor. Alex é um ferrado.
Mas eu respondi outra coisa, óbvio. Mesmo com tanta informação, eu tentei ser no mínimo simpático.
- O Alex doutora é um cara que tem dois filhos, tem uma esposa que se chama Solange, tem uma mãe que chama Maria Benedita e um pai que se chama João Azevedo, que tem uma casa aqui na sua cidade.
- Puxa Alex! Que lindo seu depoimento sobre você! Você realmente acredita ser isso?
Eu pensei: essa louca quer chegar aonde? O que ela quer que eu fale??? Eu não vou acertar nunca!
- Então doutora, eu acho que sim. Porque?
- Porque você só falou coisas referentes a possuir… “Eu tenho filhos, tenho esposa, tenho país, tenho uma casa..”. Se eu tirasse tudo isso de você, se nada disso pudesse entrar em suas referências, quem seria você?
- Um desempregado ferrado…
- Entendi… Você está desempregado?
- Sim, aliás acho que foi por isso que minha esposa te procurou.
- Foi sua esposa que pediu que viesse?
- Sim doutora, eu não viria sozinho aqui. Eu não tenho saco para conversar.
- E se eu te dissesse que não vai estar aqui para conversar? Que o tratamento é mais prático e profundo? Você acreditaria?
- Bem, não sei. Nunca na minha vida passei por isso. Tem 15 anos que eu trabalhava no mesmo lugar, tem 9 anos que sou casado, tem 8 anos que sou pai. Tudo na minha vida é bem constante, sem tantas aventuras. Aliás, não sou o cara que gosta de aventuras e de mudanças. Eu sou feliz assim.
- Alex, eu estou feliz por você falar sobre isso. Mas porque não me conta o que aconteceu no seu trabalho? Quem sabe eu possa entender melhor como você pensa?
- Ah doutora! Eu entrei lá bem jovem, com 23 anos. Eu já namorava a Solange. Eu entrei como auxiliar de produção, e aos poucos ganhei a confiança dos chefes e fui crescendo lá. Os chefes gostavam de mim. Eu então passei a líder de produção, e estava bem com os resultados. Mas aí trocou a chefia, e o chefe me dizia que eu tinha alguns comportamentos que não eram bom pra empresa. Dizia que eu era acomodado e sem iniciativa.
- Mas você acredita nisso? O que você pensa sobre isso que seu chefe falava?
- Eu penso que ele era sem noção doutora. Ele queria que eu pensasse por ele. Eu não era o chefe, ele me dava as ordens e eu fazia. Eu não tinha a iniciativa porque não era o meu papel. Mas eu fui demitido pela crise, sabe doutora. Tá bem difícil para as empresas manterem os funcionários.
- Voce acredita mesmo que saiu pela crise?
- Sim… porque doutora?
- Mas se acredita, porque citou esses comportamentos que seu chefe se incomodava?
- Ué… porque eu to só contando. Mas não é nada demais.
- Quantas pessoas do seu setor foram demitidas?
- Só eu doutora …
- e como se sente?
- Mal né … eu disse que saiu um monte de colegas meus também porque se não, o que minha esposa pensaria né? Mas na verdade só eu …
- Certo, entendo você. Mas eu preciso da sua ajuda.
- Oxi doutora… como assim?
- Eu preciso que me confie dez horas da sua vida em sessão comigo. Eu preciso que nessas dez horas que passarmos juntos, você as multiplique em sua casa com as tarefas que eu te passarei. Eu preciso que você confie em me dizer o que sente, pensa, como se sente, e o que te faz mal. Você poderia me ajudar?
- Eu prometo que posso me esforçar. Mas a senhora vai dizer o que eu devo fazer?
- De começo sim. Mas depois você aprenderá o caminho. E poderá seguir sem mim. Já ouviu falar de uma vida com propósito?
- Acho que não … o que seria isso?
- Você acordar e ter a certeza que o que você faz como profissão, como trabalho, faz seu coração vibrar tanto que ilumina as pessoas a sua volta. É descobrir o que você pode fazer de melhor é usar isso a favor da humanidade. É poder influenciar outras pessoas por você ter uma vida que vale muito a pena. Já sentiu isso?
- Pra te ser bem honesto doutora, nunca senti isso. Eu comecei a trabalhar com 13 anos na feira, depois consegui um emprego no supermercado e depois já comecei numa fabriquinha e aí já era… os anos passaram e eu não parei para pensar no que me faz feliz. Hoje eu penso mais em pagar as contas, só isso.
- Pois te convido a usar esse tempo de algumas semanas, exatas 10 semanas, para pensar em você e sua vida. Para acertar sua rota, sabe? Para ter a certeza de como serão seus próximos anos. E poder assim, pagar todas as suas contas, mas feliz. Posso contar com você? Posso acreditar que você se empenhará nesse percurso?
- Pode sim doutora.
- Então, para iniciar, eu quero que você volte a acreditar em você. Que você volte a sonhar. A sua primeira tarefa é acreditar que mesmo o que está ruim em sua vida, veio para te favorecer. E que o universo promoverá uma série de coisas bacanas na sua vida. Mas você precisa estar aberto a isso, precisa acreditar que merece o melhor para você e sua família. Que você pode sonhar e pode realizar.
- Mas doutora, nem sei mais. Eu não tenho mais sonhos. Eu não sei nem por onde começar.
- Então vamos lá, vou te ajudar: Se hoje você tivesse todo o dinheiro do mundo, e pudesse escolher o que fazer como profissão, o que escolheria?
- Não sei, preciso pensar.
- Então pense. Pense e me diga.

Eu saí de lá bem confuso. E bem pensativo. Mas pensei que poderia ser interessante pensar um pouco diferente, ter uma outra visão da vida. Então, resolvi pagar para ver. Literalmente isso… pagar para ver. E vou fazer as dez sessões.
Ela pediu que nessas semanas eu escrevesse todos os dias o que penso ou sinto. Então já comecei. Vamos ver no que vai dar. Em 10 semanas tudo pode acontecer. Ou não. Só sei que esse treco de “Coaching” me parece ser interessante.