Postagem do Facebook em 30/08/2018


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Conto Psicanalítico
BELLA SENZ’ANIMA
O Diário de uma Prostituta
Baseado em Fatos Reais
Parte 1 – O Despertar para a Realidade

Capítulo 1 – parte III

Mas eu não sou assim, eu aprendi a ser assim e nunca questionei isso. Eu era amorosa, carinhosa, preocupada, risonha. Digo era porque a vida me empedrou. E você saberá como, até o final desse diário.

Quando completei 16 anos minha mãe embarcou para a Europa com uma das minhas irmãs para tira-la das drogas. Ela havia conseguido um trabalho. Minha irmã, a mais velha já morava lá. Eu e a outra irmã ficamos… Ficamos exatos três meses sem notícia nenhuma delas. Sofri muito, só de lembrar me dói sentir aquela ausência.

Depois de três meses recebi uma carta dizendo que ela estava bem. Só fomos nos rever depois de quase um ano, quando embarquei para lá para uma suposta “férias”. Naquela época ainda o celular era a coisa mais cara que se podia comprar. Então não tínhamos como nos falar.

Minha mãe sempre foi fascinada pelo dinheiro. Não para acumular, mas para gastar. Sempre comprou a gente com bons presentes, boa roupa, boa comida. Esse era o jeito de mostrar como nos amava.
Mas em compensação, vivíamos jogadas, vivendo nossas escolhas. Nunca foi possível conversar com ela sobre nossas escolhas. Se ela tinha uma opinião sobre algo, a opinião dela prevalecia. Se pensávamos diferente, não havia discussões, ela apenas ignorava. E nesses termos, para ela eu tinha que escolher uma profissão que desse dinheiro e um marido rico. Sim, ela sempre quis que eu estudasse, isso é fato.
E eu consegui estudar, fiz uma faculdade, da qual ela se orgulha disso.

Mas nunca consegui abandonar a prostituição para viver da minha profissão. Por alguns fatores. O primeiro deles é que realmente nunca me sinto capaz. Me sinto muito fracassada e impotente. O segundo deles é que uma vez que você aprende a viver do dinheiro “fácil”, fica difícil dar duro depois e viver de pouco dinheiro. Não nos tornamos escravos dos clientes e muito menos do prazer: nos tornamos escravos do dinheiro e do que ele pode pagar. Conheci muita prostituta casada, com filhos, que sustenta a vida do marido, que sustenta a família toda e que ainda ostenta. Conheci muita gente que viveu bem com a ideia de fazer disso uma profissão e basta. Eu nunca consegui encarar assim, com naturalidade. Mas me aprisionei cada hora por motivos diferentes, em fases diferentes da minha vida.

Toda vida de uma prostituta começa por um abuso sexual. Não, eu não fui abusada. Não houve nada que eu não tenha feito por simples vontade. O meu problema foi falta de orientação, nada de abuso. Os abusos que sofri em minha vida foram decorrentes das minhas escolhas, nada por violência ou imposição. A GENTE DEMORA A APRENDER A ESCOLHER. E é nisso aí que entra o pai e a mãe, além da paciência. E eu não tive nenhum desses itens na minha fórmula mágica. Eu tive que aprender com a vida, murro em ponta de faca, sangrando todo dia. E estou aqui para contar isso pra você. Você será meu amigo, meu diário.

- Chegamos! Hey!!! Chegamos!!!
Eu estava viajando enquanto escutava “The Cranberries” no rádio, a música “Dreams”. Ela dizia “Oh, minha vida está mudando todos os dias, de todas as maneiras possíveis. E, oh, meus sonhos nunca são exatamente como parecem, Nunca são exatamente como parecem…”
link de acesso a música: https://www.youtube.com/watch?v=lOG_xFNMgqc

… e era exatamente isso. Mas naquele momento, eu estava feliz e me divertindo. Só de sair de casa e conversar a noite toda já seria muito legal.

Desci do carro com minha bolsa.
- Onde posso me trocar?

Todas elas riram de mim.

- Não há onde se trocar amiga! Troca aí mesmo! Daqui há algum tempo você nem precisa mais tirar isso.

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Toda semana capítulos diversos
Página Facebook “Papo de Analista” com Viviane Siqueira

Esse conto retrata a realidade da prostituição vivida por um paciente de consultório. Baseado em fatores reais.